Será que existem boas razões para acreditar que Deus existe?
Ensaio filosófico desenvolvido no âmbito do Clube de Filosofia da Escola Secundária de Loulé
Ilustração de Lina Campos, criada com Microsoft Designer
1- Será que existem boas razões para acreditar que Deus existe?
2- Não existem boas razões para acreditar que Deus existe.
3.1- Um dos argumentos mais utilizados para provar a existência de
Deus é o argumento ontológico. A sua versão mais famosa, enunciada por Anselmo de Cantuária, define Deus como “algo maior do que o qual nada pode ser pensado”. Ora, é possível, segundo Anselmo de Cantuária, concebermos, nas nossas mentes, a ideia de Deus. Se Deus existe no pensamento e não na realidade, é possível conceber um ser maior que Deus (porque existir somente no pensamento não é tão perfeito como existir também na realidade), mas tal não ocorre porque Deus é “o ser maior do que o qual nada pode ser pensado”. Assim, Deus existe no pensamento e necessariamente na realidade. Mas tal como provou Immanuel Kant, a existência não é um verdadeiro predicado, isto é, não é uma propriedade como ser omnisciente ou omnipresente. Isto acontece porque a existência não acrescenta nada ao conceito de Deus. Dizer que Deus existe ou não existe significa apenas dizer que há ou não algo no mundo real que corresponda ao conceito de Deus.
Contra-argumento: Filósofos modernos, como Alvin Platinga, argumentam dizendo que a existência não é um predicado real, mas uma condição lógica de grandeza máxima, ou seja, se um ser maximamente grande é possível, este tem de ser logicamente necessário para que o possamos considerar maximamente grande.
Mas este argumento assenta numa petição de princípio, já que Deus é definido de tal forma na premissa que a sua existência seja garantida necessariamente na conclusão, sendo impossível provar a sua existência independentemente da sua definição.
3.2- O argumento cosmológico, enunciado inicialmente por Tomás de Aquino, afirma que tudo o que começou a existir tem uma causa, e essas causas foram causadas por outras causas anteriores.
Assim, ou há uma cadeia causal que regride infinitamente, ou há uma causa primeira que causou a cadeia causal. Não há uma cadeia que regrida infinitamente, logo há uma causa primeira incausada, Deus. No entanto, este argumento não nos dá uma boa razão para acreditar na existência de Deus, já que nada nele nos garante que essa causa primeira é forçosamente o Deus teísta.
Contra-argumento: Mas seria incoerente pensar que a causa primeira não tivesse origem divina, já que qualquer causa imperfeita teria de ser, necessariamente, causada por outra causa anterior. Só Deus não necessitaria de causa. Este argumento pode ser, no entanto, refutado com as descobertas na área da Física Quântica no século XX. Cientistas (nos quais se pode destacar, por exemplo, Schrödinger) provaram que as relações causais são mais complexas do que se imaginava. Provou-se ainda que, no mundo atómico, dois acontecimentos A e B podem ser ao mesmo tempo a causa e a consequência um do outro. Deste modo, não estamos em condições sequer de afirmar que existe uma causa primeira, e muito menos que essa causa é Deus.
3.3- O conceito teísta de Deus defino-o como um ser omnipotente, omnisciente, perfeitamente bom e sumamente justo. No nosso mundo existem muitos exemplos de sofrimento, quer causado por grandes desastres naturais, como terramotos, secas, furacões (mal físico) quer por ações erradas do ser humano (o Holocausto, por exemplo). Deus, no entanto, ou não é capaz ou não quer impedir este mal. Todo o sofrimento que vemos em nosso redor, é assim, um alto indício de que Deus não exista, já que, se existisse, evitaria todo o mal.
Contra-argumento- Filósofos como Leibniz procuram justificar a
criação de um mundo onde exista o mal, por parte de Deus. Deus,
por ser omnipotente, teve a capacidade de criar qualquer mundo
possível, o que incluiria um mundo sem mal, e, com a sua omnisciência, imaginou todos os mundos possíveis. A sua perfeita bondade obrigou-o a criar o melhor mundo possível, o nosso. Assim,
o mal é necessário no nosso mundo, já que sem ele podíamos estar a perder um bem maior. Ora, mas se Deus é omnipotente e
sumamente bom, conseguiria, sem dúvida, eliminar o mal no mundo,
mantendo eventuais virtudes que dele se pudessem extrair. Além
disso, parece incoerente pensar que há um bem maior que se possa
extrair, por exemplo, do assassinato de milhões de judeus durante o
Holocausto ou do sofrimento prolongado provocado por uma doença
incurável.
3.4- Tomemos agora, o famoso “Bule de Chá de Russell”. Se alguém afirma que “existe um bule de chá que gira em torno do Sol, tão pequeno que não dispomos de tecnologia suficientemente poderosa para o detetar”, será impossível, por mais absurda que pareça a ideia, negar esta afirmação. Sendo assim, cabe, a quem enunciou esta ideia, prová-la, e não, a quem não acredita nela, refutá-la. Centrando-nos no caso de Deus: cabe aos teísticas provar que Deus existe e não aos ateus provar o contrário. Como, até hoje, os teístas não nos forneceram nenhum argumento sólido a favor da existência de Deus, conclui-se que não há bons motivos para acreditar na sua existência.
Contra-argumento: Tal como Alvin Platinga argumentou, embora não haja como provar que o bule não existe, há fortes indícios de que este não está no espaço. Assim, se os ateus acreditam que Deus não existe, deviam ser capazes de apresentar provas para sustentar essa teoria. Mas este contra-argumento não é válido, já que, mesmo se fosse necessário apresentar argumentos contra a existência de Deus, estes existem, como o argumento do mal, que nos mostra que é bastante improvável que Deus exista.
Texto de:
Leonardo Cândido
11.º D – 2023-2024|Clube de Filosofia