Bússola Estudantil

Jornal escolar da Escola Secundária de Loulé

“Será possível conhecer?” (II)

Continuação de:
https://erasmus-esl.pt/BussolaEstudantil/blog/2024/01/12/sera-possivel-conhecer/

Neste caso, atendendo-se à definição de ‘Conhecer’ dada, o problema do presente Ensaio poderia, então, também, ser explicitado pela seguinte Formulação: “ Será possível o ato de adesão de um sujeito a uma formulação do seu intelecto que expressa algo que dada coisa ‘realmente’ ‘é’ ? Uma vez apresentadas as referidas Formulações que exteriorizam o que ‘idealmente’ ‘é’ o ‘Ser Ideal’ que será associado ao termo ‘Conhecer’ ao longo do presente Ensaio, para que efetivamente se explicite em que sentido o Problema formulado foi colocado, tendo em vista à sua resolução, é ainda da competência das presentes Considerações Gerais Iniciais a explicitação do sentido que o termo ‘Possível’ toma na formulação do Problema apresentado.

De facto, poderemos perguntar se “Será possível ‘Conhecer’?” no mesmo sentido em que nos perguntamos se “Será possível um ‘Cubo Esférico”?”, isto é, adotando o termo possível numa primeira aceção enquanto “possibilidade da existência desse ‘Ser’ na ‘Realidade’ ”; sendo esta possibilidade corroborada se a ‘Realidade’ do referente deste termo, o ‘Ser Conhecer’, não acarretar por si só a violação dos ‘Princípios do Ser’ (expressos primordialmente sobre a forma dos três Princípios fundamentais da Lógica Clássica) a que todo o ‘Ser Real’ de todo o ‘Objeto da Realidade’, enquanto ‘Ser’, respeita. Por exemplo, o caso do ‘Cubo Esférico’ é um claro exemplo de um ‘Ser Ideal’ impossível na ‘Realidade’ na medida em que, se um dado ‘Objeto da Realidade’ ‘substancialmente’ ‘fosse’ ‘Cubo’ e, simultaneamente, ‘‘fosse’ ‘Esférico’, então esse ‘Objeto da Realidade’ ‘seria’ ‘Cubo’ e ‘não seria’ ‘Cubo’ (na medida em que, pela sua Definição, se algum ‘Objeto da Realidade’ ‘realmente’ ‘é’ ‘Esférico’, então esse ‘Objeto da Realidade’ ‘realmente’ ‘não é’ ‘Cubo’), o que implicaria uma clara violação do Princípio da Não-Contradição.

Porém, não é com base nesta primeira aceção do termo possível que o Problema formulado é colocado. Neste caso, o termo possível está colocado numa segunda aceção da qual deriva o verdadeiro sentido no qual o Problema apresentado foi formulado. Possível, aqui, evidencia a “possibilidade da concretização do ato de ‘Conhecer’ em algum ‘Sujeito’ da ‘Realidade’ ”. É, assim, no sentido de questionar quanto à possibilidade de algum ‘Sujeito’ da ‘Realidade’ concreto efetivamente ‘Conhecer’, e, em particular a ‘Pessoa Humana’, que o Problema em causa foi formulado.

No entanto, é de evidenciar que antes de poder fazer incidir a questão sobre um outro qualquer ‘Sujeito’ da ‘Realidade’ terei que a fazer incidir sobre a minha própria ‘pessoa’. De facto, se não me for possível ‘Conhecer’, então jamais ‘conhecerei’ se um outro qualquer ‘Sujeito’ da ‘Realidade’ efetivamente pode ‘Conhecer’, ou mesmo se existe um qualquer outro ‘Sujeito’ na ‘Realidade’.

Ao voltar a questão à minha ‘pessoa’, porém, é evidente no entanto que também contra mim terei que fazer incidir uma determinada sequência de questões: terei, primeiramente, que determinar com exatidão se ‘realmente’ ‘existe’ na ‘Realidade’ um ‘Ser Eu’; de seguida, no caso de resposta afirmativa, terei que proceder a uma investigação no sentido de determinar se a ‘natureza’ desse ‘Objeto da Realidade’ no qual ‘substancialmente’ habita o meu ‘Eu’ possui efetivamente a potência de ‘Conhecer’ algo.

Só de seguida, para uma resposta mais integral ao Problema formulado, procurarei dirigir a investigação para o exterior, procurando ‘Conhecer’ outros ‘Objetos da ‘Realidade’ e, neste sentido, se algum destes possui a efetiva potência de se concretizar como ‘Sujeito Cognoscente’.

Teses Históricas de resposta ao Problema

De facto, ao longo da História da Filosofia, os filósofos procuraram responder a se de facto nós, Sujeitos Humanos, possuímos ou não efetivamente alguma Faculdade ou conjunto de Faculdades tal que nos permitisse, mediante uma dada garantia, constituir uma Formulação que expressasse algo que dado Objeto da Realidade realmente é de modo tal que permitisse a adesão do referido Sujeito a essa Verdade.

Neste sentido, podemos distinguir primeiramente dois tipos de abordagem de resposta ao problema: uma primeira, na qual os filósofos procuraram tal Formulação garantidamente Verdadeira unicamente ao nível da Faculdade da Razão; e, uma segunda, na qual os filósofos, pela falha desta primeira abordagem, se viraram para a Experiência Sensível, ou Sensibilidade, procurando, somente a partir desta, constituir efetivo Conhecimento acerca da Realidade. Ora, obviamente, ambas estas abordagens falharam.

Por um lado, ao nível da primeira abordagem, os filósofos procuraram essencialmente formar Sistemas do Saber recorrendo unicamente à Razão Intuitiva, à Razão Indutiva ou à Razão Dedutiva.

Alguns deles afirmam que a Razão Intuitiva é passível de fornecer ao Sujeito Crenças Básicas ou Fundacionais. Pelo mero Pensamento – considerado enquanto Atividade e enquanto concebedor de Seres Ideais –, afirmam eles, seria possível concluir, pelas simples Definições desses Seres Ideais racionalmente concebidos, ou mesmo pela própria atividade do discorrer racional das ideias, determinados enunciados Verdadeiros. Ora, nada mais falso.

No primeiro caso, afirmam que seria possível, simplesmente pelas Definições de Seres Ideais, concluir a Realidade desses Seres, simplesmente por uma Intuitiva Necessidade, isto é, por uma necessidade de concretização real que adviria dessas próprias Definições (ou seja, da ideal Natureza desses Seres). Porém, tais necessidades só se concretizariam de facto, se, primeiramente, existisse algum Objeto da Realidade que substancialmente fosse esse Ser. Um Ser Ideal que exige a sua existência apenas nos leva a crer que, se esse Ser de facto se manifestar num dado Objeto da Realidade, então ele exige/implica/causa, per si, a existência a si mesmo. Assim, tal Serpressupondo a sua Realidade, apenas se concretizaria se, primeiramente, algo tivesse gerado a sua existência num dado Objeto da Realidade (e, a partir daí, pela sua Natureza, ele fosse causa sui), ou se esse Ser existisse num dado Objeto da Realidade desde toda a Eternidade. Naturalmente, este tipo de Argumento Intuitivo, os Argumentos Ontológicos, foram utilizados, primordialmente, em relação à Prova da Existência de Deus, por pensadores como Descartes ou Santo Anselmo, por exemplo, partindo da noção de Perfeição intrínseca ao Deus Cristão. De modo geral, para eles, a Existência seria uma propriedade intrínseca ao Ser Ideal Deus que eles concebiam, visto este, pela sua Natureza, ser Perfeito. Porém, daí concluíam que a sua noção de Deus necessariamente realmente existiria enquanto Ser Real, o que, pelo já explicitado, não corresponderia por si só, necessariamente, à Realidade. Da Definição desse Ser Ideal perfeito apenas poderíamos concluir que, se esse Ser realmente existisse num dado Objeto da Realidade, então seria Causa Sui. Porém, é de notar que estes Argumentos Ontológicos não são válidos para qualquer outro Ser que queiramos idealmente conceber como contendo, na sua própria Natureza, a sua existência. É o caso, por exemplo, de um “Unicornixistente”: seja o Ser Ideal associado a este Termo o tal que engloba a ideal Natureza do Ser Ideal Unicórnio e, simultaneamente, a ideal Natureza do Ser Ideal Existência. Ora, daqui não se segue que um “Unicornixistente” necessariamente existe em algum Objeto da Realidade, mas apenas que, se existisse, então seria causa de si mesmo (visto conter na sua Natureza a Existência).

Como uma segunda abordagem de tentativa de Conhecer pela via exclusiva da Razão Intuitiva, alguns filósofos, dos quais Descartes é sem dúvida alguma o mais proeminente, procuraram afirmar Conhecer pelo simples facto de se aperceberem de que discorriam acerca dos seus pensamentos. Todavia, em primeiro lugar, parece-me evidente que a consciencialização do pensamento por um sujeito, não constitui, de todo, algo obtido mediante Evidência (8) obtida pela Razão Intuitiva, mas sim pela Experienciação do Pensar (o que nos impediria de nomenclar este conhecimento como obtido via Intuição). De facto, se Descartes fosse coerente consigo mesmo e, portanto, com a sua aplicação de uma Dúvida efetivamente Radical e Hiperbólica (embora isto seja evidententemente impossível), então jamais poderia considerar que ele próprio pensava (pois que, em verdade, numa fase inicial, haveria a seríssima possibilidade de estar a ser iludido por um Génio Maligno) e, portanto, jamais poderia obter qualquer Evidência que fosse, pois que toda a Evidência pressupõe o prévio surgimento de algo ao espírito (neste caso, pelos dados obtidos pela Experienciação do Pensar), para que, posteriormente, possa ser interpretado como efetivamente Claro e Distinto, ou seja, como Evidente. Neste sentido, nada do que é Evidente poderá ser considerado, em situação alguma, como obtido Intuitivamente. Em segundo lugar, desconsiderando tudo isto, parece-me ainda que a simples consciencialização do pensar não permite, por si, constituir qualquer Conhecimento da existência do Eu. Este Conhecimento que se identificaria naturalmente ao Conhecimento do Eu, não advém, obviamente, da simples consciencialização instantânea do momentâneo pensar (“Penso…”, diria Descartes…) visto que, se assim fosse (“… Logo, [Eu] existo!”, prosseguiria Descartes), então implicaria que o Eu estaria limitado ao conteúdo instantâneo do pensar; o que impossibilitaria que o Eu se tratasse do algo que unifica temporalmente, espacialmente, e, neste sentido, ontologicamente, o nosso Objeto da Realidade e tudo o que é a si subjacente (como os pensamentos); e, portanto, impossibilitaria que fosse de facto aquilo a que a generalidade do Senso Comum designa de Eu, o Ser Real Eu.

Outros, partindo desta, ou não, afirmaram a Razão Dedutiva e a Razão Indutiva como capazes de gerarem, isoladamente de outras Faculdades não Racionais, Conhecimento.

Em primeiro lugar, parece-me evidente que a Razão Indutiva, enquanto tomada no seu sentido empirista, isto é, de capacidade generalizadora, previsionista ou analogista, jamais conseguirá gerar Conhecimento num dado Sujeito: quer porque, sozinha, não possui quaisquer premissas tais que lhe permitam inferir, pelos seus princícios da Lógica Informal, conclusões; quer porque, mesmo que as possuísse, jamais esta terá a capacidade de garantir a Verdade das Formulações que infere, na exata medida em que procede a essas inferências baseando-se no Hábito (como, muito bem, nos evidencia David Hume) em vez de na efetiva Razão de Ser dos fenómenos e, portanto, dos acontecimentos da Realidade. Em segundo lugar, parece-me também evidente que quer a Razão Dedutiva como a Razão Indutivo-Abstrativa (tomada em sentido Aristotélico), jamais terão a potência de, sem recurso a uma outra qualquer Faculdade que permita efetivo contacto com a Realidade e, neste sentido, que seja fonte de premissas, inferir, ora por via da Racional Necessidade, ora por via da Abstração Racional, qualquer Formulação acerca do que um qualquer Objeto da Realidade realmente seja. Deste modo, temos que jamais será possível, pelas Faculdades Racionais acessíveis ao Sujeito Humano tomadas isoladamente, obter qualquer Formulação garantidamente Verdadeira acerca da Realidade. Por outro lado, no que concerne ao segundo grupo de filósofos inicialmente descrito, perante esta evidente impossibilidade de se constituir Conhecimento meramente por via da Razão, estes procuraram obtê-lo simplesmente recorrendo à  Experiência Sensível (aos Sentidos) e, numa segunda fase, à Sensibilidade em geral (o que engloba também as Emoções).

No entanto, primeiramente, ao longo da História da Filosofia nenhum filósofo procurou demonstrar de que modo, se é que existe algum, é que alguma destas Faculdades da Sensibilidade poderia, por si, fornecer uma garantia de que, de facto, as informações que por elas nos chegam ao Intelecto são efetivas imagens da Realidade.

De facto, quem nos garante que, ao vermos um livro, efetivamente estamos diante de um efetivo Objeto da Realidade que realmente é um livro? Não haverá a possibilidade de um Génio Maligno nos iludir dando-nos a perceção de que estamos perante um livro, quando de facto não estamos? Não haverá a possibilidade de estarmos acorrentados a uma máquina que nos ilude? Ou, de estarmos a presenciar meras sombras que não constituem de facto imagens unívocas da Realidade? Há efetiva necessidade de explicitação, por algum Princípio de Garantia de que as imagens obtidas pela Sensibilidade nos revelam a Realidade. Mas, haverá algum? Esta é uma pergunta que, infelizmente, nenhum filósofo empirista se dignou a responder seriamente, apelando sempre aos apertados limites da mera Razão.

Por outro lado, é de notar que a garantia de que as imagens que recebemos pela Sensibilidade efetivamente nos revelam os Objetos da Realidade não constituiria por si só Conhecimento. Para isso, sendo o Conhecimento a adesão de um Sujeito a uma Formulação do seu Intelecto que expressa algo que dada coisa realmente é, torna-se imprescindível a apreensão do que esses Objetos da Realidade experienciados realmente são. Para isso, tornar-se-á sempre imprescindível a Razão Indutivo-Abstrativa.

Neste âmbito, surgiu ainda um terceiro grupo de filósofos que procurou conciliar para fins de obtenção de Conhecimento a Sensibilidade com a Razão. Destes, destacam- se Aristóteles, com o seu Método Indutivo-Abstrativo de apreensão das Formas Substanciais das Substâncias; Immanuel Kant, com a sua Tese que referia o Conhecimento enquanto Colaboração entre a Sensibilidade e o Entendimento; e as Fenomenologias de diversos filósofos, como Edmund Husserl.

No entanto, e visto que, neste caso, pelo supracitado, as Faculdades Racionais nada poderão Conhecer sem que a Sensibilidade forneça imagem dos referentes Objetos da Realidade, conclui-se que nem mediante esta colaboração será possível o Conhecimento, sem que antes se apresente, primeiramente, efetivo Princípio de Garantia de que as Imagens Sensíveis expressam de facto os efetivos Objetos da Realidade. E, se tal não for possível, conclui-se que é impossível o Conhecimento enquanto mera associação das potencialidades das Faculdades Humanas da Razão e da Experiência Sensível.

Mas, e se assim, for? Ora, se assim for, recai sobre nós uma de duas possibilidades de resposta ao Problema apresentado: ou, em verdade, possuímos ainda pelo menos mais uma Faculdade que, isoladamente ou conjuntamente com as anteriores, nos permite de facto obter um Princípio de Garantia tal que nos permita conhecer; ou, então, estamos abandonados à terrível possibilidade de o Conhecimento não se encontrar de facto acessível a nós. Neste caso, o Nihilismo total e absoluto instalar-se-ia ao espírito de todos os que sobre isto refletissem, o que colocaria em causa tudo inclusive, em última análise, o sentido teleológico-ontológico para as nossas vidas, os preceitos ético-morais invioláveis, e, em última análise, o Bem Comum das Sociedades… Em última análise, e procurando fugir a todo o Falso Dilema, ou a Pessoa Humana seria reduzida à sua Animalidade, ou seria o Fim, total. Eis, neste sentido, a extraordinária importância Fundacional de se dar resposta definitiva ao Problema formulado no presente Ensaio.

(8) Evidência é aqui empregue em sentido cartesiano (algo Claro e Distinto).

(continua…)

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